Texto de RITA SILVA FREIRE
Fotografias de HELENA GARCIA
“O Tempo de Anabela” - com 33 anos de vida e 15 de carreira,
O que aconteceu, diz, é que tinha compromissos para a promoção de Nós, pelo que iria ter de faltar, cerca de duas noites por mês, ao musical. De acordo com Anabela, isso não seria problema, pois uma substituta asseguraria o espectáculo nessas noites. Foi só após três semanas de ensaios que percebeu que essa substituta nunca existiria. Como Anabela não possui o dom da ubiquidade, e como já se tinha comprometido com o disco, abandonou o musical. «Sem zangas», reforça.
Aliás, é com um sorriso estampado na cara, de quem não tem problemas com o mundo, que Anabela vai falando sobre si. «Este ano comemoro vinte e cinco de carreira», afirma. É difícil acreditar. A cantora parece ter esses mesmos 25 de vida. Baixinha, magrinha, com ar de miúda, é a prova viva de que as aparências enganam. «Tenho 33 anos. Comecei a cantar aos oito». E a verdade é que o tempo passa rápido e engana a memória menos atenta. Já lá vão 17 anos desde o dia em que, aos 16, a jovem celebrizou a canção de Paulo Carvalho "A Cidade Até Ser Dia". Quase duas décadas depois, é ainda esta canção que logo surge na memória quando se pensa em Anabela.
Mas muito mais aconteceu na vida da cantora, que desde então lançou já vários álbuns e foi protagonista de vários musicais. Nascida há 33 anos em Almada, desde muito pequena que Anabela descobriu na voz uma vocação. Família e amigos estavam habituados a ouvi-la, ainda criança, a cantarolar por todo o lado. Até que um dia, um amigo da mãe, palhaço de profissão - costumava animar festas no Jardim Zoológico -, chamou a atenção para a voz de Anabela, sugerindo que a pequena devia começar a cantar em festas e espectáculos para os mais novos. «Comecei a fazer espectáculos de música infantil e a cantar em festas de Natal. Ao mesmo tempo, ia participando em festivais que existiam no país, promovidos pelas câmaras municipais, dirigidos a crianças. E ganhei imensos prémios», conta. A partir daí nunca mais parou. Gravou o primeiro single aos nove anos. E aos 12, em 1989 participou no concurso A Grande Noite do Fado. Em 1991 lançou "Anabela" e, em 1992 "Encanto".
Mas foi no ano seguinte, em 1993, que a carreira da então adolescente Anabela deu um grande salto, quando realizou um sonho que a acompanhava desde sempre: participar no Festival da Canção. «Estava à espera de fazer 16 anos para poder concorrer. Assim que os cumpri, fiz de tudo para conseguir». Mas não foi fácil. Candidatou-se com dois pares de canções. Nenhuma foi aceite. Anabela não desistiu. Descobriu um tema de Pedro Abrantes, Marco Quelhas e Paulo de Carvalho que ainda não tinha intérprete. Falou com eles e convenceu-os. E lá conseguiu ir ao Festival RTP da Canção. «Não esperava ganhar», diz. «Estava a concorrer contra grandes nomes, como o José Cid». Mas o improvável aconteceu e Anabela, de 16 anos, classificou-se em primeiro lugar, deixando todos os outros para trás.
Graças a isso, rumou à Irlanda, para representar Portugal no Festival Eurovisão da Canção em 1993. Na mala levava consigo os livros da escola, que também já a tinham acompanhado em Lisboa. «Estava em exames nessa altura, tinha mesmo que estudar». Lia até a mãe a chamar para entrar em cena. «Estudava até entrar em palco. Tinha consciência de que era importante, de que tinha de passar. Mas depois fechava os livros e entrava noutro mundo». A jovem Anabela arrecadou, na Irlanda, um 10.° lugar, com 60 pontos. E passou de ano.
Quando voltou para Portugal, a sorte já estava lançada. Participou no programa de televisão "Grande Noite", dirigido por Filipe La Féria. Depois, foi convidada para "Cabaret", também produzido por La Féria e transmitido pela RTP. A partir daí nasceu uma relação que se prolongaria até hoje. Depois destes programas, o encenador convidou-a para fazer "Jasmim ou o Sonho do Cinema", agora já no Politeama. E, em seguida, o musical "Amália", na Madeira. Depois, Anabela andou em tournée, durante cerca de dois anos e meio, com o músico espanhol Carlos Núñez, que a convidou a participar no seu disco "Mayo Longo".
No regresso voltou aos musicais, novamente pela mão de La Féria, que a convidou para fazer o "My Fair Lady". Seguiram-se-lhe "Canção de Lisboa"; "Música no Coração", "Jesus Cristo Super Star" e "West Side Story". Pelo meio;, Anabela gravou discos como "Primeiras Águas" (1996), "Origens" (1999), "Aether" (2005) e "Encontro" (2006).
E, como energia é o que não lhe falta, a par de toda esta actividade, licenciou-se em Psicologia, no Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA). Mas não foram tempos fáceis. «Foi difícil conciliar tudo porque, felizmente, sempre tive muito trabalho. Às vezes tinha mesmo que faltar às aulas. Mas gostava muito de entrar nesse outro mundo. E sempre tive uma grande capacidade de me focar».
No entanto, nunca exerceu. «Não me imagino num consultório, com uma placa a dizer Anabela Pires, Psicóloga», diz a rir. Mas imagina-se integrada num projecto, especialmente se este estiver relacionado com artistas e artes de palco. Por isso, conta, agora está a frequentar um mestrado em Psicologia da Linguagem, na Universidade Autónoma de Lisboa. «Sempre me interessou a questão da voz e dos processos psicológicos da performance artística. Quem sabe se um dia não vou poder explorar esta área da Psicologia. Até porque é uma pena ter tirado o curso e nunca ter feito nada».
O futuro, sabe, é incerto. Mas não tem medo de correr riscos. Agora vai trabalhar na promoção do disco e acabar o mestrado. E espera regressar aos musicais que adora fazer. Quer continuar a cantar e a actuar. E gostaria de ter um projecto na área da Psicologia, relacionado com a formação de actores ou voltado para crianças com talento. Já cumpriu o sonho de protagonizar "Música no Coração" e "West Side Story". E é difícil ter sonhos quando já se alcançou tanto. Um dia. porém, gostava de ser a Mary Poppins"